Sargento trans da Marinha poderá usar nome social e trajes femininos
Para magistrado, imposição de padrões masculinos é discriminatória e gera indenização de R$ 80 mil.
quinta-feira, 27 de janeiro de 2022
O juiz Federal Daniel Chiaretti, da 1ª vara Federal de Corumbá/MS, determinou à Marinha que autorize uma mulher trans, sargento da corporação, a adotar o nome social e utilizar uniformes e cabelos femininos. A decisão também condenou a União ao pagamento de R$ 80 mil por danos morais.
Para o magistrado, a imposição de padrões masculinos de apresentação física e a utilização do nome e sexo de nascimento são discriminatórias.
“A premissa fundamental no presente caso é o direito à igualdade, previsto no artigo 5º, caput, da Constituição Federal e em diversos tratados internacionais A partir daí, temos um mandamento proibitivo de discriminação, consagrando assim a existência de um direito antidiscriminatório que conta com amplo alicerce convencional.”
Você sabia? Apesar de existir na Língua Portuguesa as formas femininas “soldada”, “sargenta”, “coronela”, “capitã” e “generala”, as Forças Armadas resolveram não adotá-las, preferindo utilizar o nome do posto tanto para homens como para mulheres, sendo a única diferenciação no artigo. Dessa forma, uma mulher é tratada como “a sargento”.
O magistrado frisou que, segundo opinião consultiva 24/17, da Corte Interamericana de Direitos Humanos, a mudança do nome e a adequação dos registros e documentos são protegidos pela Convenção Americana de Direitos Humanos.
O juiz Federal citou entendimento do STF, no sentido de que a identidade de gênero deve ser respeitada em razão dos direitos fundamentais presentes na Constituição.
“Se o indivíduo for tolhido, em qualquer das esferas sociais que participa (família, trabalho, religião), de portar-se de acordo com seu senso corporal, não estará exercendo sua humanidade na totalidade, tampouco lhes serão plenos os direitos sociais, caso tenha que optar, por exemplo, entre sua identificação de gênero e o trabalho.”
Processo
A ação judicial foi proposta por mulher trans, integrante da Marinha, pedindo a utilização de nome e trajes femininos, bem como indenização por danos morais. No processo, a União argumentou que o concurso público previa vagas exclusivamente masculinas. Também alegou que o contingente de vagas femininas é menor, com menor concorrência.
O juiz Federal não acatou as alegações do ente público. “Ao simplificar a questão desta maneira, a União está desconsiderando todas as angústias demonstradas nos documentos médicos. A transição ocorreu anos após o ingresso, não é o caso de se falar em qualquer burla ao sistema de concursos ou de promoção no serviço público. A situação é absolutamente excepcional, não gerando qualquer impacto expressivo na organização administrativa da Marinha do Brasil”, concluiu.
Dano moral
De acordo com o magistrado, a conduta da instituição pública violou os direitos de personalidade e justifica o pagamento de indenização por dano moral.
“A resposta judicial deve levar em conta não apenas a dimensão individual, mas a tutela do direito à igualdade e à diversidade em uma sociedade pluralista. Diante interesse jurídico lesado e as circunstâncias do caso concreto, deve ser fixado um valor de R$ 80 mil, o qual está, inclusive, de acordo com a jurisprudência do E. TRF da 3ª Região em casos análogos”.
Assim, o magistrado confirmou decisão liminar que determinou à Marinha a autorização do uso de uniformes e cabelos femininos, além do uso do nome social em sua identificação e em documentos administrativos. No mérito, a União também foi condenada ao pagamento de R$ 80 mil por danos morais.
Processo: 5000410-46.2021.4.03.6004
Informações: TRF-3.
Por: Redação do Migalhas
Atualizado em: 27/1/2022 11:24
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